sábado, 17 de setembro de 2011

Exortação ao perdão dos corações - parte 2

Existem momentos-chaves na nossa vida, eu realmente creio nisso. Momentos de passagem, de travessia, obliteração, destruição. Sejam momentos de criação ou de destruição, ou mesmo de permanência (vale lembrar que a tradição é uma revolução às vezes, exige sacrifício), o fato é que precisamos desses momentos para nos sacudir do torpor, nos indicar um caminho a seguir. O problema é que o destino nos prega peças.

Assim é que você pensa que chegou a um desses momentos-chave e se entrega às mudanças e cataclismas de forma absurda e irrefletida, de um jeito fatalista, e percebe que embarcou em uma canoa furada. É um mal tipicamente geminiano, quer dizer, típico de pessoas impulsivas e indecisas. Acontecem essas decepções frequentemente e, infelizmente, comigo acontecem direto, sempre. É isso que tem me feito sofrer mais que tudo.

Fiquei obcecado com o amor que eu julgava perdido, e isso durou anos, tanto tempo! Foi difícil retomar contato com ela, foi duro e patético. Mas quando me convenci de que não só fui perdoado de forma desonesta, mas também fui esquecido, ignorado... digamos que esse foi um golpe duríssimo. Momento-chave! O amor secaria aos poucos como sentimento, mas felizmente o momento foi certeiro o bastante para que a lembrança dela se tornasse doce e querida, mas distante e nada parecida com ódio ou qualquer tipo de mágoa.

Nossos corações se estabeleceram firmes, pelo menos o meu foi ferido e perdoado. E pelas minhas próprias neuras e obsessões, pelos meus próprios erros e sentimentos ardorosos e idiotas. Ele foi ferido sim, mas ele foi curado. Ele foi curado pela frieza dela, pelo distanciamento, pela nobreza dela. Isso teria me cativado se eu não olhasse essa atitude como modelo, como uma atitude digna de respeito e digna de ser buscada em mim, não copiada, mas buscada. Encontrei minha distância também, minha nobreza, encontrei em mim o sentido de mim mesmo, minha continuidade sem obsessão.

No final, os corações se perdoaram. O coração dela perdoou o meu pela infantilidade, graças ao riso que lhe proporcionou. O meu coração perdoou a frieza winterféllica dela. O coração dela vive se perdoando, por isso, ela é forte. O meu coração também se perdoou, e eu me tornei livre.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Exortação ao perdão dos corações - parte 1

Saber que nosso amor durou tão pouco tempo e nos pareceu uma eternidade, reconhecer que fomos tão ludibriados pelo coração, que sofremos tanto por conta de um sentimento que jamais deveria 'vir-a-ser'? O amor é uma coisa incompreensível, jamais abstraído e sempre presente em uma variedade de níveis. Por que explicar isso? Para quê?


Eu só queria me lembrar de como era me sentir tão elevado, tão acima do mundo e suas pequenezes, contar com aquele sorriso sério, com as palavras boas da minha alma. Porque você era minha alma, compartilhava dos meus segredos, bebia da mesma fonte da vida, eramos um. Ou assim cria eu. Acreditava na unidade dos nossos instintos, na força das mãos que se apertavam, dos lábios que se tocavam. Você me enganou por dentro antes de me enganar por fora, desviou o fado.


É duro relembrar coisas tristes, mastigar e ruminar os sentimentos destruídos, os cacos do amor, da amizade. Mas o fato é que não houve nada quebrado, porque não havia o que quebrar. Você quebrou minhas esperanças mas continuou intacta. Como? Você não doou nada, não se entregou, nem via e sentia como eu via e sentia. Você foi um furacão silencioso, um anjo na minha vida, um anjo caído que me levou a sanidade, parte da vida e estilhaçou meu coração. Mas isso você só fez porque eu me ofereci inteiro a você, julgando, pobre diabo!, que você faria o mesmo por mim.


Mas você não doou nada, e nem posso dizer que foi por uma falta minha, ou porque você foi fria. Não! Você não doou nada porque não havia o que doar. Você sorria e amava de um jeito caloroso, mas era apenas o lado de fora, era só gratidão e afeição, você não tinha o que amar, simplesmente. Você nem sabia amar! Nem sei se já sabe!

sábado, 3 de setembro de 2011

"Porque o essencial é invisível aos olhos"

Minha impressão mais profunda ao ler o Pequeno Príncipe no fim da adolescência foi de muito amor, não qualquer amor ou um amor específico, mas um amor muito grande pela humanidade. A humanidade concreta, não a ideia 'humanidade'. Existiram outras impressões menos profundas, menos claras, outras bem sentimentais. Aliás sentimentalismo é a palavra que eu buscava, tornei-me sentimental demais nos períodos de leitura, sentimental até com o próprio livro, com a raposinha, com a rosa. Complicado isso.


Lembro de sentir uma reviravolta na minha vida interior: uma tristeza muito grande, uma melancolia profunda, todas essas coisas lindas e maravilhosas que moralizam de dentro, que ensinam e forma, que aquecem o coração, com esperança ou com lágrimas. Lembro de ser reeducado para o sofrimento, para a dor, a aprender a amar o amor.


O "essencial é invisível aos olhos" foi o que mais me tocou, porém, mais até que toda a ideia do 'cativo' envolvendo o pequeno príncipe e a raposinha. Não se trata de credulidade, ou de metafísica, mas de uma valorização dos sentimentos como poucos puderam defender de forma mais simples. Nem Goethe.

Esquecer

A vida nos ensina muitas coisas, talvez as principais sejam a desconfiança, o desespero, a desmedida, o ódio. Viver é portanto esquecer, esquecer as pessoas que te fazem mal, as experiências malfadadas, o cheiro da podridão que exala a sociedade, a 'boa sociedade'. Esquecer é uma bênção, um dom que poucos possuem. Ainda assim é um dom subestimado.

Tenho muito medo de esquecer de esquecer, de perder esse dom, obscurecê-lo, confiná-lo nalgum buraco escuro da minha alma e alimentar outros sentimentos, crescer no odiar, no amar, na profundidade doentia dos impulsos. Eu sou um bom esquecedor, não que eu apenas me livre do rancor, não, isso não é algo ativo em mim, um 'esquecer consciente', é um desleixo no lembrar, o esquecimento mais passivo, quase uma moça delicada que é incapaz de pensar em ofensas porque isso ofende seu gosto. E assim entendo onde está a fraqueza da minha alma. Falta de seriedade.

Por que tudo em mim é assim? Esse choro constante, tristezas que voltam novas e férteis, sentimentos contraditórios, por que essa volúpia, essa fragilidade na eleição de ideais? Por que esse sentimentalismo de moça virgem, essa dificuldade de conviver com o duro, com o sofrimento, e, pior, essa impossibilidade de encarar a mentira, a traição e a intriga? Por que? Eis a espada de dois gumes que é o esquecimento: ele te impede de sofrer e de crescer. Não há maturidade sem um pouco de rancor e decepção, sem ranger de dentes.